Ora! O que é a opinião pública para o IBOPE? O que é a opinião pública para o Vox Populi? O que é a opinião pública para o Datafolha? Opinião pública é a somatória das opiniões individuais sobre temas, por eles mesmos aferidos. Então naturalmente essa concepção é uma concepção tentadora. E ela é tentadora porque? Porque a opinião pública é apresentada pelos institutos de sondagem, sob a forma de números. Sob a forma de porcentagem. Sob a forma de tabela. Sob a forma de gráficos de pizza ou de torre. Assim, diariamente nos jornais, nós lemos que cinquenta e tantos por cento dos paulistanos consideram o pior dos males a droga na família. Jornal de ontem! Sondagem sobre o governo Dilma. Sesenta e tantos por cento de excelente, ou ótimo. Jornal de hoje. E não haverá um único dia, que a tal opinião pública, não venha expressa no jornal, sob a forma de uma porcentagem qualquer.
Muito bem! Sendo assim, a opinião pública apresentada como a somatória das opiniões individuais; é preciso mesmo fazer uma reflexão. Quais são as premissas para que isso seja possível? Comecemos então pela primeira premissa, que é a própria avaliação dos conceitos que estamos tratando. Conforme o próprio nome indica, opinião pública é constituído por duas palavras. A palavra opinião, que é um substantivo; indica portanto uma substância. E pública, que é um adjetivo e indica portanto um atributo. Tomemos um paralelo. Chocolate amargo. Chocolate é a substância e amargo é um atributo possível dessa substância. Muito bem! O que a gente conclui sobre chocolate amargo? É que há chocolate que não é amargo. Pode ser ao leite, crocante, semi-amargo e assim por diante. Paralelamente haverá aquela opinião; que não é pública! E a pergunta é: qual a especificidade da opinião pública em relação ao universo que a contém, o universo da opinião? Se fossêmos pensar como matemáticos, imaginaríamos dois conjuntos; um contido no outro; sendo que o conjunto da opinião pública de raio muito menor, que o conjunto da simples opinião. Toda opinião pública é uma opinião, e nem toda opinião é pública. Então evidentemente, cabe-nos esse esclarecimento. Comecemos pelo que é mais amplo, opinião.
Toda opinião pressupõe dois elementos: o primeiro elemento de toda opinião é um dado da realidade. Esse dado da realidade se configura no objeto da opinião. Isso é, aquilo sobre o que opinamos. Então perceba; toda opinião tem um objeto. Toda opinião tem um alvo. Toda opinião é opinião sobre alguma coisa. Evidentemente essa alguma coisa varia de A a Z. Basta estar no mundo. Assim podemos ter opinião sobre a aula do professor Clóvis. Podemos ter opinião sobre decisão política. Podemos também ter opinião sobre uma obra de arte. Podemos ter opinião sobre um fenômeno natural. Podemos ter opinião, enfim, sobre uma ferramenta e sua utilidade. É possível opinar sobre qualquer coisa. Mas a opinião, não se exaure no seu objeto. O elemento mais expressivo de uma opinião, o elemento mais apetitoso de uma opinião, é o valor que atribuímos a esse objeto. Assim quando você diz: a aula do professor Clóvis foi meia boca, você tem aí, os dois ingredientes para uma opinião. O seu objeto; dado de realidade, a aula do professor Clóvis, e o valor a ela atribuído: meia boca. Perceba que esse valor é resultado de uma atribuição. É por isso que ele é chamado de atributo
Atributo. É resultado de uma atribuição. A meia boca não está na aula, a meia boca é grudada na aula, por alguém que a observa. Muito bem! Assim podemos atribuir valor a uma decisão, podemos atribuir valor a uma obra de arte, dizer que tal música é horrível, dizer que tal comentário é impertinente, julgar tal glúteo espetacular, e assim poderemos ter opinião sobre tudo, desde que haja atribuição de valor, sobre algum dado de realidade. Ora meus amigos, seguindo uma lógica sadia; se a opinião pública é um tipo de opinião, também tem um objeto e um valor. E se a opinião pública tem uma especificidade em relação a uma opinião geral, essa especificidade está no seu objeto e no seu valor. Muito bem, qual é a especificidade do objeto da opinião pública? Se eu disser que comi a pouco, um sanduiche que me foi preparado sobre medida, à La carte, de queijo branco com banana, pela dona Hermínia, ela mesma e o sanduiche estava magnífico, existe aí, uma opinião. Mas ela não é pública. O sanduiche de banana, da dona Hermínia não satisfaz os requisitos do objeto da opinião pública. E por que? Porque a opinião pública, terá por objeto temas que dizem respeito a toda a cidade. A toda pólis. Temas políticos, portanto. O que ainda não é o caso, desse sanduiche. Se por acaso, ele desencadeasse uma epidemia; que tivesse consequências políticas, a opinião sobre ele, poderia tornar-se pública. Mas não é o caso. Existe opinião que não é pública, e a minha opinião sobre o sanduiche é um exemplo. Da mesma maneira, quando você sai lá fora e diz: já assisti à aulas melhores do professor; essa opinião, também não é pública. Porque não atende aos requisitos de um objeto da opinião pública, não diz respeito a toda a cidade.
E assim você poderia perguntar, com muita legitimidade, o que é preciso para que qualquer coisa, satisfaça o requisito de dizer respeito a toda cidade, de ser público, portanto? Ora dependendo da época, as condições mudam. Lá na Atenas antiga, um tema satisfaria essa condição, se fosse debatido na Ágora. Porque a ágora é a condição material de conversão de um tema privado, levado pelo cidadão, em tema público porque discutido na ágora. Perceba; a propositura de uma temática para discussão na ágora, tinha o efeito de transformar uma temática, até então privada, como uma cizânia (discórdia, confusão, brigas, discussões, divisões) entre vizinhos, numa questão pública, porque debatida ali. Com o desaparecimento da ágora, sempre se perguntou qual o novo requisito. O fato é, que nos dias que correm, o requsito óbvio, para que um tema possa interessar toda a cidade, é que de alguma maneira, ele esteja presente nas pautas dos meios de comunicação. É exatamente esse o coração e a medula da hipótese do agenda setting, que você já estudou com com excelência. A agenda dos meios, determina a agenda pública, portanto, a agenda dos meios é condição para o pertencimento a agenda pública. .Isso faz com que, nos dias que correm, a opinião pública para ser pública, terá que ter por objeto, um tema presente nos meios de comunicação de massa. Naturalmente que o surgimento da internet, pode relativizar essa assertiva. Estamos aí dispostos a discutir e rediscutir as sempre novas condições de conversão do privado em público. Por enquanto, ainda continuamos com esse tipo de proposta. Ora! Se o objeto da opinião pública não é qualquer objeto, mas um objeto que atenda a esse pré-requisito de publicidade, o valor também não é qualquer um. Porque o valor da opinião pública, não é atribuído ao seu objeto por um indivíduo isolado, mas sempre por um grupo, sempre por uma quantidade imporartante de pessoas. É um valor compartilhado. É um valor coletivo e compartilhdo. É um convicção de valor compartilhada por muita gente. Então você percebe, que no caso da opinião pública temos uma especificidade, com relação à opinião simples, no que diz respeito ao seu objeto, no que diz respeito ao valor, forma de atribuição de valor a esse objeto.